Por Eduardo Ângelo da Silva
Deixo aqui o registro de um momento muito significativo em minha trajetória, a participação na Conferência Internacional “O Custo da Oportunidade: Educar para Libertar”.
Como todo estudante de origem popular, nos anos 90 sentíamos que os vestibulares públicos estavam lá para nos massacrar. Tentei muitos vestibulares até conseguir ingressar em uma graduação pública. Por não ter condições de pagar os cursos especializados, fui tentando e acumulando experiência sobre os exames. Em casa, eu sempre tive uma grande referência de um estudante pobre que ascendeu através da educação. Meu pai, filho de um ajudante de pedreiro que um dia se tornou pedreiro, conseguiu realizar “o milagre” de ser aprovado no vestibular da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em 1971, durante a ditadura militar, período de grande desigualdade social. No início de seu ano letivo, em 1972, ele já estava certo de que não poderia iniciar o curso, pois trabalhava o dia inteiro. Seu patrão, Sr. Vicente Ângelo Rosa, decidiu reduzir seu horário de trabalho e aumentar sua remuneração para que ele avançasse nos estudos. Em homenagem ao Sr. Vicente, eu e meus irmãos temos o “Ângelo” em nossos nomes. Meu pai, que cresceu na periferia miserável de Juiz de Fora, tornou-se um excelente e querido professor de Língua Portuguesa. Penso que essa história foi uma das coisas que meu deu forças para não desistir.
Era uma competição muito injusta. Embora eu tivesse ciência das habilidades que desenvolvi na escola, relacionadas à interpretação, análise lógica, entre outras, elas não eram suficientes nas disputas com as pessoas que podiam pagar por seu treinamento especializado. O ENEM foi um avanço nesse sentido e nivelou, em certa medida, o campo de disputas.
Fui brindado pela vida com a oportunidade de trabalhar por 10 anos em um pré-vestibular social [Cederj] onde pude tentar ajudar jovens, que, como eu, buscavam concretizar o sonho de ingressar no ensino superior. Foi um honra!
A apresentação conectou minha experiência como aluno e professor, em relação ao tema e agradeço muito a oportunidade.
Na foto de minha apresentação, “Nivelando o campo de jogo: o Exame ENEM como uma conquista democrática”, aponto para o valor do salário mínimo [R$ 415,00] vigente durante as inscrições para vestibulares 2009, UFRJ [R$95,00] e UFF [R$97,00]. O valor das inscrições era inacessível a muitos.
Infelizmente, o Governo Temer (golpista) vem tomando providências para elitizar o exame. Determinou um período absurdamente reduzido para a solicitação de isenções e aumentou a taxa de inscrição.
Além da significativa expansão do ensino superior público é preciso que defendamos formas mais democráticas de ingresso!
O perigo de graves retrocessos nos ronda!